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quinta-feira, 29 de julho de 2010

As questões da vida. Iveraldo Pereira.

As questões da vida.




E a vida, e a vida o que é? Diga lá meu irmão...


Não existe ainda o manual prático “Como dar sempre as respostas certas nas questões da vida” eu acho sinceramente que nunca vai haver esse manual, seria muito maçante acertar sempre, ser alegre sempre e tudo dar certo SEMPRE; não quero dizer também que vamos passar a vida inteira dando respostas erradas às questões da vida e no final do “curso” sermos reprovados.


A vida está sempre nos pedindo para que escolhamos as respostas para que continuemos na jornada, é como se houvesse dois quadradinhos e lá temos que marcar um “X” em um dos dois, logo a frente tem um “SIM” e no outro tem um “NÃO”, na correria dos tempos modernos estamos sempre com pressa, temos um milhão de coisas para resolver, somos bem informados, ( temos todos os jornais do mundo a mão, todas as mais recentes pesquisas, os últimos lançamentos de tudo,ou seja ,temos acesso a internet); não podemos perder tempo pensando ou consultando os mais experientes para sabermos o que fazer,”time is Money”.


O resultado da prova às vezes é instantâneo e às vezes demora mais um pouco para conferir, a maneira mais comum de sabermos se erramos ou acertamos é quando estamos fazendo o que não queremos, no meio de pessoas que não gostamos, (reprovamos o caráter) e no lugar onde não gostaríamos de estar, aí descobrimos que demos um monte de respostas erradas e passamos a dizer que somos infelizes.


Essas respostas, certas ou erradas passam a fazer parte do nosso ser, mas é difícil assumir que erramos, é sempre mais prático culparmos os outros e continuar fingindo que está tudo bem, que isso vai passar e que esse cara que vocês estão vendo não sou eu; eu ESTOU assim, mas na realidade eu não SOU assim, eu nunca errei. Ser e estar são duas coisas totalmente diferentes, só em inglês é que o verbo “to be” é a mesma coisa.( ser e estar).


Um exemplo bom para essa situação é a condição dos presidiários, dos aidéticos, das pessoas com câncer no pulmão por causa do cigarro e por aí vai...


Temos solução para este dilema? É claro que não, olhe em sua volta, veja o exemplo de homens e mulheres que fazem a diferença neste mundo, seus erros provocaram grandes estragos em suas vidas e uns se reergueram enquanto que outros sumiram.


No evangelho que Lucas escreveu, no capítulo 15, versículo 11 em diante, o Senhor Jesus conta a parábola do filho pródigo, nos versículos 16 e 17 Ele nos mostra essa condição e o que o jovem em questão fez para resolver o seu problema.


Naquele que apesar de conhecer as nossas fraquezas e limitações nos ama incondicionalmente...


Iveraldo Pereira.
http:// iveraldopereiragmail.blogspot.com

quarta-feira, 28 de julho de 2010

Carta ao Reverendo Van Diesel -AUGUSTUS NICODEMUS LOPES

Carta ao Reverendo Van Diesel
[Mais uma carta fictícia. Não existe o Reverendo Van Diesel, pelo menos não com este nome...]

Prezado Reverendo Van Diesel,

Obrigado por ter respondido minha carta. Você foi muito gentil em responder minhas perguntas e explicar os motivos pelos quais você costuma ungir com óleo os membros de sua igreja e os visitantes durante os cultos, além de ungir os objetos usados nos cultos.


Foto do armário do Rev. Van Diesel - óleo santo
importado de Israel
Eu não queria incomodá-lo com isto, mas o Severino, membro da minha igreja que participou dos seus cultos por três domingos seguidos, voltou meio perturbado com o que viu na sua igreja e me pediu respostas. Foi por isto que lhe mandei a primeira carta. Agradeço a delicadeza de ter respondido e dado as explicações para sua prática.

Sem querer abusar de sua gentileza e paciência, mas contando com o fato de que somos pastores da mesma denominação, permita-me comentar os argumentos que você citou como justificativa para a unção com óleo nos cultos.

Você escreveu, "A unção com óleo era uma prática ordenada por Deus no Antigo Testamento para a consagração de sacerdotes e dos reis, como foi o caso com Arão e seus filhos (Ex 28:41) e Davi (1Sam 16:13). Portanto, isto dá base para se ungir pessoas no culto para consagrá-las a Deus." Meu caro Van Diesel, nós aprendemos melhor do que isto no seminário presbiteriano. Você sabe muito bem que os rituais do Antigo Testamento eram simbólicos e típicos e que foram abolidos em Cristo. Além do mais, o método usado para consagrar pessoas a Deus no Novo Testamento para a realização de uma tarefa é a imposição de mãos. Os apóstolos não ungiram os diáconos quando estes foram nomeados e instalados, mas lhes impuseram as mãos (Atos 6.6). Pastores também eram consagrados pela imposição de mãos e não pela unção com óleo (1Tim 4.14). Não há um único exemplo de pessoas sendo consagradas ou ordenadas para os ofícios da Igreja cristã mediante unção com óleo. A imposição de mãos para os ofícios cristãos substituiu a unção com óleo para consagrar sacerdotes e reis.

Você disse que "Deus mandou Moisés ungir com óleo santo os objetos do templo, como a arca e demais utensílios (Ex 40.10). Da mesma forma hoje podemos ungir as coisas do templo cristão, como púlpito, instrumentos musicais e aparelhos de som para dedicá-los ao serviço de Deus. Eu e o Reverendo Mazola, meu co-pastor, fazemos isto todos os domingos antes do culto." Acho que aqui é a mesma coisa que eu disse no parágrafo anterior. A unção com óleo sagrado dos utensílios do templo fazia parte das leis cerimoniais próprias do Antigo Testamento. De acordo com a carta aos Hebreus, estes utensílios, bem como o santuário onde eles estavam, “não passam de ordenanças da carne, baseadas somente em comidas, e bebidas, e diversas abluções, impostas até ao tempo oportuno de reforma” (Hb 9.10). Além disto, o templo de Salomão já passou como tipo e figura da Igreja e dos crentes, onde agora habita o Espírito de Deus (1Co 3.16; 6.19). Não há um único exemplo, uma ordem ou orientação no Novo Testamento para que se pratique a unção de objetos para abençoá-los. Na verdade, isto é misticismo pagão, puro fetichismo, pensar que objetos absorvem bênção ou maldição.

Você também argumentou que “Jesus mandou os apóstolos ungir os doentes quando os mandou pregar o Evangelho. Eles ungiram os doentes e estes ficaram curados (Mc 6.13).” Nisto você está correto. Mas note o seguinte: (1) foi aos Doze que Jesus deu esta ordem; (2) eles ungiram somente os doentes; (3) e quando ungiam, os enfermos eram curados. Se você, Van Diesel, e seu auxiliar Mazola, curam a todos os doentes que vocês ungem nos cultos, calo-me para sempre. Mas o que ocorre? Vocês ungem todo mundo que aparece na igreja, crianças, jovens, adultos e velhos... Você fica de um lado e o Mazola do outro, e as pessoas passam no meio e são untadas com óleo na testa, gente sadia e com saúde. Se há enfermos no meio, eles não parecem ficar curados. Pelo menos o membro da minha igreja que esteve ai por três domingos seguidos não viu nenhum caso de cura. Ele me disse que você e o Mazola ungem o povo para prosperidade, bênção, proteção, libertação, etc. É bem diferente do que os apóstolos fizeram, não é mesmo?


Unção de partes íntimas? Fala sério, mano!
Quando eu questionei a unção das partes íntimas que você faz numa reunião especial durante a semana, você replicou que “a unção com óleo sagrado e abençoado é um meio de bênção para as pessoas com problemas de esterilidade e se aplicado nas partes íntimas, torna as pessoas férteis. Já vi vários casos destes aqui na minha igreja.” Sinceramente, Van Diesel, me dê ao menos uma prova pequena de que esta prática tem qualquer fundamento bíblico! Lamento dizer isto, mas dá a impressão que você perdeu o bom senso! Eu me pergunto por que seu presbitério ainda não tomou providências quanto a estas práticas suas. Deve ser porque o presidente, Reverendo Peroba, seu amigo, faz as mesmas coisas.

Seu último argumento foi que “Tiago mandou que os doentes fossem ungidos com óleo em nome de Jesus (Tg 5.14).” Pois é, eu não teria problemas se os pastores fizessem exatamente o que Tiago está dizendo. Note nesta passagem os seguintes pontos.
A iniciativa é do doente: “Está alguém entre vós doente? Chame os presbíteros da igreja, e estes façam oração sobre ele, ungindo-o com óleo, em nome do Senhor."
Ele chama “os presbíteros da igreja” e não somente o pastor.
O evento se dá na casa do doente e não na igreja.
E o foco da passagem de Tiago, é a oração da fé. É ela que levanta o doente, “E a oração da fé salvará o enfermo, e o Senhor o levantará; e, se houver cometido pecados, ser-lhe-ão perdoados” (Tg 5.15).
Ou seja, não tem como usar esta passagem para justificar o “culto da unção com óleo santo” que você faz todas as quintas-feiras e onde unge quem aparece. Não há confissão de pecados, não há quebrantamento, nada do que Tiago associa com esta cerimônia na casa do doente.

Quer saber, Van Diesel, eu até que não teria muitos problemas se os presbíteros fossem até a casa de um crente doente, que os convidou, e lá orassem por ele, ungindo com óleo, como figura da ação do Espírito Santo. Se tudo isto fosse feito também com um exame espiritual da vida do doente (pois às vezes Deus usa a doença para nos disciplinar), ficaria de bom tamanho. E se houvesse confissão, quebrantamento, mudança de vida, eu diria amém!

Mas até sobre esta unção familiar eu tenho dúvida, diante do uso errado que tem sido feito da unção com óleo hoje. De um lado, há a extrema unção da Igreja Católica, tida como sacramento e meio de absolvição para os que estão gravemente enfermos e se preparam para a morte. Por outro, há os abusos feitos por pastores evangélicos, como você. O crente doente que convida os presbíteros para orarem em sua casa e ungi-lo com óleo o faz por qual motivo? Ungir com óleo era comum na cultura judaica e oriental antiga. Mas entre nós...? Será que este crente pensa que a unção com óleo tem poderes miraculosos? Será que ele pensa que a oração dos presbíteros tem um poder especial para curar? Se ele passa a semana assistindo os programas das seitas neopentecostais certamente terá idéias erradas sobre unção com óleo. Numa situação destas de grande confusão, e diante do fato que a unção com óleo para enfermos é secundária diante da oração e confissão de pecados, eu recomendaria grande prudência e discernimento.

Mas, encerro por aqui. Mais uma vez, obrigado por ter respondido à minha primeira carta e peço sua paciência para comigo, na hora de ler meus contra-argumentos.

Um grande abraço,

Augustus

PS: Ah, o Reverendo Oliveira e o Presbítero Gallo, seus conhecidos, estão aqui mandando lembranças. Eles discordaram veementemente desta minha carta, mas fazer o quê...?

PS2: Desculpe ter publicado a foto que o Severino acabou tirando daquele seu armário no gabinete pastoral... ele não resistiu.

O Calvinismo segundo Entendo . AUGUSTUS NICODEMUS LOPES



Calvinistas estão entre as tradições religiosas mais mal compreendidas da história da Igreja. Sei perfeitamente que alguns deles fizeram por merecer. Há calvinistas que defendem suas convicções sem caridade, gentileza e sensibilidade para com quem diverge. Outros, não conseguem ouvir quem não seja calvinista. Não considero essas atitudes como intrínsecas ao calvinismo. As pessoas são assim porque lhes faltam domínio próprio e humildade, e não porque são calvinistas. Não há nada no calvinismo que exija que calvinistas sejam rudes, intransigentes, mal educados, excessivamente críticos e arrogantes.

Boa parte das acusações que têm sido feitas aos calvinistas, além de serem generalizações injustas, parecem proceder de uma falta de conhecimento adequado do que os calvinistas realmente acreditam. Como não falo por todos, vou dizer o que eu penso sobre alguns desses pontos mais polêmicos.

Para começar, o calvinismo não é um bloco monolítico. Há várias correntes dentro dele. Todas se vêem como legítimas herdeiras do legado de João Calvino, desde presbiterianos liberais até puritanos modernos. Considero-me um calvinista dentro da tradição teológica que elaborou e até hoje mantém a Confissão de Fé de Westminster, muito similar às demais confissões reformadas dos batistas, congregacionais, episcopais e reformados.

1 – Creio que Deus predestinou tudo o que acontece, mas não sou determinista. O Deus que determinou todas as coisas é um Deus pessoal, inteligente, que traçou seus planos infalíveis levando em conta a responsabilidade moral de suas criaturas. Ele não é uma força impessoal, como o destino. Não creio que os atos da vontade e da liberdade humanas sejam mera ilusão e que nossa sensação de liberdade ao cometê-los seja uma farsa, como o determinismo sugere. Eu acredito que as nossas decisões e escolhas são bem reais e que fazem a diferença. Elas não são uma brincadeira de mau gosto da parte de Deus. Os hipercalvinistas são deterministas quando negam a responsabilidade humana ou pregam a passividade dos cristãos diante de um futuro inexorável. Por desconhecer essa distinção, muitos pensam que todos os calvinistas são deterministas e que eles vêem o homem como um mero autômato.

2 – Creio que Deus é absolutamente soberano e onisciente sem que isso, contudo, anule a responsabilidade do homem diante dele. Para mim, isso é um mistério sem solução debaixo do sol. Não sei como Deus consegue ser soberano sem que a vontade de suas criaturas seja violentada. Apesar disto, convivo diariamente com essas duas verdades, pois vejo que estão reveladas lado a lado nas Escrituras, às vezes num mesmo capítulo e até num mesmo versículo! (Ex: Atos 2:23).

3 – Encaro a relação entre a soberania de Deus e a responsabilidade humana como sendo parte dos mistérios acerca do ser Deus, como a doutrina da Trindade e das duas naturezas de Cristo. A soberania de Deus e a responsabilidade humana têm que ser mantidas juntas num só corpo, sem mistura, sem confusão, sem fusão e sem diminuição de ambas.

4 – Creio que Deus predestinou desde a eternidade aqueles que irão se salvar e, ao mesmo tempo, oro pelos perdidos, evangelizo e contribuo para a obra missionária. Grandes missionários da história das missões eram calvinistas convictos. Calvinistas pregam sermões evangelísticos e instam para que os pecadores se arrependam e creiam. Se quiserem um bom exemplo, leiam O Spurgeon que Foi Esquecido, de Iain Murray, publicado pela PES. Nunca as minhas convicções sobre a predestinação me impediram de ir de porta em porta, oferecendo o Evangelho de Cristo a todos, sem exceção. Após minha conversão, e já calvinista, trabalhei como evangelista e plantador de igrejas durante vários anos, em Pernambuco.

5 – Creio que Deus já sabe, mas oro assim mesmo. Sei que ele ouve e responde, e que minhas orações fazem a diferença. Contudo, sei que ao final, através de minhas orações, Deus terá realizado toda a sua vontade. Não sei como ele faz isso. Mas, não me incomoda nem um pouco. Não creio que minha oração seja um movimento ilusório no tabuleiro da predestinação divina.

6 – Não creio que Deus predestinou todos para a salvação. Da mesma forma, não creio que ele foi injusto nem fez acepção de pessoas para com aqueles que não foram eleitos. Não creio que Deus tenha predestinado inocentes ao inferno, pois não há inocentes entre os membros da raça humana. E nem que ele tenha deixado de conceder sua graça a pessoas que mereciam recebê-la, pois igualmente não há pessoa alguma que mereça qualquer coisa de Deus, a não ser a justa condenação por seus pecados. Deus predestinou para a salvação pecadores perdidos, merecedores do inferno. Ao deixar de predestinar alguns, ele não cometeu injustiça alguma, no meu entender, pois não tinha qualquer obrigação moral, legal ou emocional de lhes oferecer qualquer coisa. Penso assim pois entendo que a Queda de Adão veio antes da predestinação na seqüência lógica (não na seqüência histórica) em que Deus elaborou o plano da salvação.

7 – Creio que Deus sabe o futuro, não porque previu o que ia acontecer, mas porque já determinou tudo que acontecerá. Por isso, entendo que a presciência de que a Bíblia fala é decorrente da predestinação, e não o contrário. Quem nega a predestinação e insiste somente na presciência de Deus com o alvo de proteger a liberdade do homem tem muitos problemas. Quem criou o que Deus previu? E, se Deus conhece antecipadamente a decisão livre que um homem vai tomar no futuro, então ela não é mais uma decisão livre. Nesse ponto, reconheço a coerência dos socinianos e dos teólogos relacionais, que sentiram a necessidade de negar não somente a soberania, mas também a presciência de Deus, para poderem afirmar a plena liberdade humana.

8 – Creio que apesar de ter decretado tudo que existe desde a eternidade, Deus acompanha a execução de seus planos dentro do tempo, e se comunica conosco nessa condição. Quando a Bíblia fala de um jeito que parece que Deus nem conhece o futuro e que muda de idéia o tempo todo, é Deus falando como se estivesse dentro do tempo e acompanhando em seqüência, ao nosso lado, os acontecimentos. É a única maneira pela qual ele pode se fazer compreensível a nós. Quem melhor explica isso é John Frame, no livro Nenhum Outro Deus, lançado pela Editora Cultura Cristã. Minha esposa teve o privilégio de traduzir e eu de prefaciar essa obra, a primeira em português a combater a teologia relacional.

9 – Creio que Deus é soberano e bom, mas não tenho respostas lógicas e racionais para a contradição que parece haver entre um Deus soberano e bom que governa totalmente o universo, por um lado, e por outro, e a presença do mal nesse universo. Diante da perversidade e dos horrores desse mundo, alguns dizem que Deus é soberano mas não é bom, pois permite tudo isto. Outros, que ele é bom mas não é soberano, pois não consegue impedir tais coisas. Para mim, a Bíblia diz claramente que Deus não somente é soberano e bom – mas que ele é santo e odeia o mal. Ao mesmo tempo, a Bíblia reconhece a presença do mal do mundo e a realidade da dor e do sofrimento que esse mal traz. Ainda assim, não oferece qualquer explicação sobre como essas duas realidades podem existir ao mesmo tempo. Simplesmente pede que as recebamos, creiamos nelas e que vivamos na cereteza de que um dia ele haverá de extinguir completamente o mal e seus efeitos nesse mundo.

10 – Estou convencido que o calvinismo é o sistema doutrinário mais próximo daquele ensinado na Bíblia, ao mesmo tempo em que confesso que ele não tem todas as respostas. Todavia, estou convencido que os demais sistemas têm menos respostas ainda. Leio autores das mais diferentes persuasões teológicas. Às vezes tenho sido mais desafiado e tenho aprendido mais com livros de outras tradições. Não deixo de ouvir alguém somente porque não é calvinista. Há calvinistas que não são assim. Contudo, é uma injustiça acusar a todos de estreiteza, sectarismo, obscurantismo e preconceito.

Espero ter deixado claro que um calvinista, para mim, é basicamente um cristão que tem a coragem de aceitar as coisas que a Bíblia diz sobre a relação entre Deus e o homem e reconhecer que não tem explicações lógicas para elas. Para muitos, esse retrato é de alguém teologicamente fraco e no mínimo confuso. Mas, na verdade, é o retrato de quem deseja calar onde a Bíblia se cala.

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[Este post é uma versão atualizada de "[Mais de] Cinco Pontos do [Meu] Calvinismo," postado aqui no blog em fevereiro de 2006 pela primeira vez. Achei que seria relevante republicá-lo diante da discussão entre os nossos comentaristas sobre calvinismo. Antes que perguntem: não, não mudei em absolutamente nada de lá para cá, continuo o calvinista de sempre...]
POSTADO POR AUGUSTUS NICODEMUS LOPES
blog O TEMPORA! - O MORES!
Agradeço pela permissão para publicar este artigo neste blog.

O REINO DE DEUS E A IGREJA -Profº Wilson Roberto

O REINO DE DEUS E A IGREJA
Romanos 14.17

Nesta sociedade pós-moderna enfrentamos um sério problema em pensar no Reino de Deus. Tornamo-nos extremamente secularizados e assim a nossa lógica é quase sempre materialista, visando lucros e alcançando o sucesso. A teologia da prosperidade – ainda que os seus “bispos” insistam em dizer que ela não existe – já está estabelecida na Igreja Evangélica contemporânea. Toda a nossa liturgia segue esse padrão de vitórias e restituições, nossos cânticos exigem que os anjos tragam as bênçãos – custe o que custar. A nossa homilética tornou-se mitológica, alicerçada numa exegese recheada de símbolos. É muito comum hoje - até nas igrejas históricas – o pregador apresentar um discurso acalorado para falar de finanças, afirmando que a nossa oferta abrirá as portas do céu sobre a nossa cabeça. O nosso evangelismo promete uma vida comparada ao estilo MATRIX, onde o bem e o mal se enfrentam no mundo virtual, e que basta um telefonema e todo se resolve. O Reino de Deus apresentado na Bíblia é voltado para o serviço, a renúncia, sem promessas de conquistas pessoais ou qualquer “liquidação de bênçãos sem medida”. Jesus nos ensina que se o inimigo nos perseguir nós devemos amá-lo, se tivermos duas túnicas dividirmos uma delas com quem não tem nenhuma, que neste mundo teríamos aflições, mas cultivássemos o bom ânimo. Um reino que exalta muito mais o dar do que o receber. Exalta os humilhados, mas abate os exaltados. Abomina o pecado, mas ama incondicionalmente o pecador. Os ensinos sobre Reino de Deus também estão inseridos em todo o Novo Testamento, entretanto, existe uma explicação dada por Paulo que vai nos ajudar muito. Esta citação encontra-se em Romanos 14:17 que diz: “Porque o reino de Deus não é comida nem bebida, mas justiça, e paz, e alegria no Espírito Santo". Nós só poderemos promover o Reino de Deus quando promovermos a justiça, a paz e a alegria sobre a terra. Isso é Reino de Deus, o que ouvimos por aí hoje e dia não passa de retórica e técnica de marketing, para se alcançar cada vez mais adeptos. Peço que a misericórdia de Deus nos alcance antes que corramos a terra inteira atrás de prosélitos e os tornemos duas vezes filhos do inferno. (Mt 23.15)
Postado por Profº Wilson Roberto
Agradeço ao Profº Wilson Roberto por permitir a publicação deste artigo no blog: A tua palavra é a verdade.

blog resistencia protestante sobre a marcha para Jesus‏

A marcha para JESUS.

Na última quinta-feira, dia 03/09, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva sancionou o projeto de lei que institui o Dia Nacional da Marcha para Jesus. Além da presença de Michel Temer, da ministra-chefe da Casa Civil, Dilma Rousseff e do senador e bispo da Igreja Universal, Marcelo Crivella, estavam presentes no evento os bispos Estevam e Sônia Hernandes, da Igreja Renascer em Cristo. O casal voltou ao Brasil no começo de agosto, depois de um período de dois anos e seis meses de prisão e liberdade condicional nos Estados Unidos. Eles foram condenados após tentar entrar no país com US$ 56 mil não declarados.

Antes de considerar o despropósito desta marcha, é preciso registrar a vergonha que temos ao ver o povo evangélico representado por um bispo da Igreja Universal do Reino de Deus e pelo casal Hernandes.

Entrando agora no mérito desta Marcha, alisto abaixo 10 motivos pelos quais nenhum cristão deveria participar desta marcha:

1. A igreja e a marcha são lideradas por um homem que se autodenomina apóstolo. Este é um erro cada vez mais freqüente em algumas denominações neo-pentecostais de nosso país. É sabido que o título “apóstolo” foi reservado àquele primeiro grupo de homens escolhidos por Cristo. Após a traição e suicídio de Judas, os apóstolos escolheram outro para ocupar o seu lugar (At 1.15-20), mas, como foi feita esta escolha? Que critérios foram usados? Ei-los: 1º) Ter sido discípulo de Jesus durante o seu ministério terreno; 2º) Ter sido testemunha ocular do Cristo ressurreto. Como pode alguém, hoje, ousar sustentar o título de apóstolo?

2. A igreja que organiza a marcha ensina Teologia da Prosperidade (crença de que o cristão deve ser próspero financeiramente), Confissão Positiva (crença no poder profético das palavras – assim como Deus falou e tudo foi criado, eu também falo e tudo acontece), Quebra de maldições (convicção de que podem existir maldições, mesmo na vida dos já salvos por Cristo) e Espíritos Territoriais (crença em espíritos malignos que governam sob determinadas áreas de uma cidade).

3. A filosofia da marcha está fundamentada em uma Teologia Triunfalista (tudo sempre vai dar certo, não existem problemas na vida do crente), tendo como base textos como Êxodo 14 (passagem de Israel no mar Vermelho) e Josué 6 (destruição de Jericó);

4. Uma das finalidades da marcha é promover curas e libertações;

5. A marcha não celebra culto, e sim show gospel;

6. Os líderes do movimento propagam que a marcha tem o poder de "mudar o destino de uma nação";

7. Na visão do grupo, com base em Josué 1.3 "Todo lugar que pisar a planta do vosso pé, vo-lo tenho dado", a marcha é uma reivindicação do lugar por onde passam na cidade;

8. Na visão do grupo, a marcha serve para tapar as "brechas deixadas pelos atos ímpios de nossa nação";

9. Na visão do grupo, a marcha destrói "fortalezas erguidas pelos inimigo em certas áreas em nossas cidades e regiões";

10. A marcha tem caráter isolacionista, próprio de gueto, e não o que Cristo nos ensinou, a saber, envolvimento amplo na sociedade (Mt 5.13-16), com irrepreensível testemunho cristão (1Pe 2.12).

Ademais, é importante observar que toda a organização da marcha está centrada nas mãos de uma igreja apenas, excluindo-se o alegado caráter de união entre os evangélicos.

Tanta força e entusiasmo deveriam ser canalizados para a pregação do Evangelho a esta nação cada vez mais sedenta. As pesquisas indicam que os evangélicos já somam 15% da população brasileira, no entanto, a imoralidade, a corrupção e a violência são cada vez maiores em nosso país. Os canais de TV, os programas de rádio, bem como as marchas, não têm gerado transformação de vida em nosso povo.

A marcha que Cristo ensinou à sua igreja foi outra, silenciosa e efetiva, tal qual o sal penetrando no alimento (Mt 5.13); pessoal e de relacionamento, como na igreja primitiva (At 8.4); cotidiana e sem cessar, como entre os primeiros convertidos (At 2.42-47).

Que Deus nos restaure esta visão.

Segue link: http://resistenciaprotestante.blogspot.com/2009/09/10-motivos-para-nao-ir-na-marcha-para.html

terça-feira, 27 de julho de 2010

Deus não é seu empregado! - Por: Renato N. Fontes

Deus não é seu empregado!




Uma interpretação biblicamente correta dos textos
distorcidos pela “teologia” da Prosperidade


Versão 1.0


Por: Renato N. Fontes (renfontes@gmail.com)
Belo Horizonte, Brasil Junho/2008








Ouvi, meus amados irmãos. Não escolheu Deus os que para o mundo são pobres, para serem ricos em fé e herdeiros do reino que Ele prometeu aos que O amam? Tiago 2:5


Não acumuleis para vós outros tesouros sobre a terra, onde a traça e a ferrugem corroem e onde ladrões escavam e roubam; mas ajuntai para vós outros tesouros no céu, onde traça nem ferrugem corrói, e onde ladrões não escavam nem roubam; porque, onde está o teu tesouro, ali estará também o teu coração. Mateus 6:19-21


Pelo que sinto prazer nas fraquezas, nas injúrias, nas necessidades, nas perseguições, nas angústias, por amor de Cristo. Porque, quando sou fraco, então é que sou forte. II Coríntios 12:10








Introdução



Este artigo é uma tentativa singela de colocar à disposição das pessoas uma boa e sólida interpretação de várias passagens bíblicas que têm sido, com muita freqüência, deturpadas por pessoas adeptas de uma doutrina que ficou conhecida como “teologia da prosperidade”, “evangelho da prosperidade” ou ainda “teologia da confissão positiva”. Os proponentes dessa doutrina, vários por falta de conhecimento e vários, infelizmente, por má fé e desonestidade, usam vários textos curtos das Escrituras, tirados do seu contexto, e torcem seu significado para fazer com que a mensagem transmitida seja exatamente o oposto do que a Bíblia ensina. Desta forma, essas passagens foram quase todas reunidas aqui e colocadas dentro do seu contexto imediato e também do contexto amplo da revelação bíblica, buscando-se assim seu verdadeiro sentido, aquele que é coerente com a mensagem do Deus que se fez pobre, não para que todos os cristãos usufruíssem de bênçãos materiais, mas para seguirmos os Seus passos e também abrirmos mão do que é nosso por amor aos outros.


A mensagem bíblica, de capa a capa, é de doação, de entrega, de amor, aquele amor que, conforme I Co 13, não busca os seus próprios interesses e tem sua maior expressão no ato dar a vida pelos outros. É verdade que Jesus se importa não só com nosso espírito mas também com todo o ser humano, integralmente. Por outro lado, nossa atitude frente a isso faz toda a diferença: baseado nessa verdade, vamos buscar benefícios para nós, como fazem os proponentes da teologia da prosperidade, ou será que isso nos fará ajudar o nosso próximo em primeiro lugar, como Jesus declara em Mt 25, quando diz, “tive fome, e me destes de comer, tive sede e me destes de beber”?


Meu desejo é que este texto abra os olhos de muitos, como um dia os meus também foram abertos! Se você, leitor, congrega em uma igreja onde se ensina essa doutrina, aconselho fortemente que tome uma atitude e pare de dar seus dízimos e contribuições para líderes que acreditam que têm o direito de “prosperar” às suas custas. Um fato muito curioso e fácil de notar é que quase todos os líderes que pregam essa doutrina de fato ficam ricos, porém suas ovelhas quase sempre continuam com o mesmo padrão de vida e nunca “prosperam” materialmente. Quando, entretanto, alguém acena com a possibilidade de parar de contribuir com a riqueza desses líderes, eles usam de intimidação e ameaçam até mesmo com a perda de salvação. É hora de dar um basta, isso é escravidão – o conhecimento da verdade liberta (Jo 8:32). Se algo não liberta, é porque não é verdade!



As citações bíblicas são da Edição Revista e Atualizada no Brasil, da SBB.





Marcos 11:24

Por isso, vos digo que tudo quanto em oração pedirdes, crede que recebestes, e será assim convosco.


Esse versículo deve ser lido em equilíbrio com outro, que é I Jo 5:14: “... esta é a confiança que temos para com ele, que, se pedirmos alguma coisa segundo a sua vontade, ele nos ouve.” João diz que Deus realmente nos dá o que pedimos, contanto que seja a Sua vontade. Deus não é nem o Papai Noel nem muito menos o Gênio da Lâmpada (que chamava Aladim de “amo e senhor”) – não, Ele é o Senhor, e é Sua vontade soberana que determina o que Ele nos dará ou não. A questão é que os defensores da teologia da prosperidade e da confissão positiva dizem que sempre é vontade de Deus curar e dar riqueza, e citam como prova os demais versículos que serão discutidos abaixo. O fato, contudo, é que a vontade de Deus é insondável, oculta em sua maior parte aos seres humanos. Ninguém, exceto por muita presunção, pode dizer que conhece a vontade de Deus em todos os casos. Seus caminhos não são os nossos e Seus pensamentos também não são os nossos (Is 55:8). Seus juízos e Seus caminhos são inescrutáveis e insondáveis, como bem nos lembra Paulo em Romanos 11!






Isaías 53:4, citado em Mateus 8:17 e I Pedro 2:24


... curou todos os que estavam doentes; para que se cumprisse o que fora dito por intermédio do profeta Isaías: Ele mesmo tomou as nossas enfermidades e carregou com as nossas doenças.


... carregando ele mesmo em seu corpo, sobre o madeiro, os nossos pecados, para que nós, mortos para os pecados, vivamos para a justiça; por suas chagas, fostes sarados.


Os “teólogos” da prosperidade e da confissão positiva dizem que a passagem de Isaías, citada de novo em Mateus e I Pedro, provaria que Deus deve sempre curar, já que Cristo já levou nossas dores e enfermidades.


Tentemos, então, levar esse pensamento às suas conseqüências lógicas. Se Cristo levou todas as nossas dores (o que é fato), e se as implicações plenas disso valessem para nós na presente era (o que questiono aqui), não deveríamos sequer morrer, já que Ele também levou sobre Si a dor da morte.


Também jamais deveria haver perseguição aos cristãos por causa do Evangelho, já que Jesus também levou essa dor sobre Si. Mas, pelo contrário, a realidade da morte é reconhecida em toda a Bíblia como o curso normal da humanidade, maculada como é pelo pecado. Não somente isso, todo tipo de enfermidade deveria ser curada – no entanto, nunca ouvimos relatos de curas de amputados, por exemplo (ainda que ouvíssemos, afinal Deus também é poderoso para curar esse tipo de mal, isso não provaria nada). Assim, essa interpretação de Isaías 53 dada pelos teólogos da prosperidade não se harmoniza com a realidade dos fatos, nem a nossa nem muito menos a dos escritores bíblicos.


Como se deve entender, então, o versículo de Isaías? Basta colocá-lo dentro do contexto de toda a Bíblia, que diz que o homem foi expulso do Éden, e a Árvore da Vida ficou do “outro lado da porta” (até que ponto é uma árvore literal ou simbólica não faz a menor diferença neste caso). Acontece que apenas em Apocalipse, na Nova Jerusalém, é que o homem terá novamente acesso àquela árvore que é “para a cura de todas as nações”. Até então, Deus disse que a terra produziria “cardos e abrolhos”. É num mundo assim que vivemos, e não há distinção entre crentes e incrédulos, afinal Deus manda a chuva sobre justos e injustos (Mt 5:45). Na verdade, até o Novo Testamento menciona doenças que não foram curadas milagrosamente, como o caso de Timóteo (I Tm 5:23), que recebeu do apóstolo Paulo o conselho de tomar vinho por causa das suas “freqüentes enfermidades” no estômago.


Mas, se Is 53:4 só se aplicará plenamente na Nova Jerusalém, por que esse versículo é citado em Mateus, sendo cumprido aqui na terra? O que acontece, neste caso, é que os seres humanos tiveram um "aperitivo" dos efeitos de Isaías 53 quando Jesus esteve fisicamente aqui. É bíblico dizer que o Reino de Deus já chegou (Mt 3:2), porém ainda não na sua plenitude (tanto é que, como já foi dito, nós ainda morremos, ainda pecamos, ainda sentimos dores etc.).


Contudo, quando o Rei esteve fisicamente aqui, pudemos provar um pouco dessa plenitude. Aliás, analisando bem, Jesus ressuscitou apenas umas duas ou três pessoas: quantos mortos havia nos cemitérios judeus na época?


Quantos enfermos havia no tanque de Betesda, onde Jesus provavelmente só curou um? Mateus cita Isaías 53 porque o que possibilitou que as curas de alguns se tornassem reais é que Jesus já pagou pelo nosso pecado. Se Ele não tivesse levado sobre si nossas dores, nenhuma cura teria sido realizada quando Jesus veio. Mas Ele não curou 100% dos enfermos, tampouco ressuscitou 100% dos mortos. Isso só vai acontecer na segunda vinda, quando o Reino de Deus vier na sua plenitude.


E quanto a I Pedro? Coloquemos a citação em I Pedro dentro do contexto, e veremos que o apóstolo falava da cura do pecado (ou seja, saúde espiritual) e não de saúde física.






João 14:12


Em verdade, em verdade vos digo que aquele que crê em mim fará também as obras que eu faço, e outras maiores fará, porque eu vou para junto do Pai.


O versículo acima tem sido citado para dizer que nós podemos e devemos fazer a mesma quantidade e os mesmos milagres que Jesus fez, portanto indo contra a tese de que a presença física de Jesus na terra foi um pré-cumprimento dos benefícios plenos de Is 53:4. Se nós faremos as mesmas obras de Jesus, dizem eles, nada mudou desde que Jesus subiu aos céus.


Cabe aqui um esclarecimento. Depois que Jesus ressuscitou e subiu aos céus, realmente continuaram acontecendo milagres, e creio eu que aconteçam até hoje. Porém, estes não acontecem na mesma intensidade e freqüência que no tempo em que Jesus esteve fisicamente aqui. Não é todo dia que vemos alguém caminhando sobre as águas, uma tempestade sendo acalmada com uma palavra, mortos ressuscitando, cegos vendo e outros sinais dessa grandeza. Quando Jesus subiu aos céus, essas coisas se tornaram bem menos freqüentes e, ouso dizer, depois que morreram os apóstolos, ficaram ainda bem mais raras. Mas Deus não é o mesmo ontem, hoje e sempre? Sim, Ele é, mas isso não o obriga a agir sempre da mesma forma, e a evidência maior disso é que temos várias alianças diferentes na Bíblia, feitas entre Ele e os homens.



Entendamos, portanto, o que representam os milagres na história do cristianismo. Em II Co 12:12, Paulo deixa claro que os “sinais, prodígios e poderes miraculosos” eram suas “credenciais” como apóstolo. Em outras palavras, essas coisas distinguiam os cristãos comuns dos apóstolos, que eram aqueles que haviam recebido sua missão diretamente do Senhor e sobre o fundamento dos quais a igreja estava edificada. Por outro lado, em I Co 12:28, Paulo também fala de dons de milagres e dons de curas, dados a pessoas que não eram apóstolos. Ainda assim, os dois versos seguintes deixam claro que, assim como não são todos apóstolos, também não são todos que possuem esses dons. Tais dons existem e são para a edificação da igreja, mas não dados a todos os cristãos e nem têm a finalidade de fazer nossas vontades. Vale lembrar que eles são distribuídos conforme a soberania de Deus, que cura e realiza milagres quando quer. Nem mesmo Jesus curou todos os enfermos do seu tempo. Mas alguém pode dizer: “Jesus não curou todos aqueles que o buscaram corretamente?” Com certeza, só que o ato de buscar a Jesus é algo que primeiramente o próprio Deus coloca no coração do homem, em Sua soberania.


Voltando então a João 14:12, o que significa “farão obras ainda maiores que as que faço”? Primeiro, Jesus não se refere necessariamente aos milagres, uma vez que não usou qualquer uma das três palavras gregas comumente usadas para designá-los no Novo Testamento (traduzidas quase sempre como “sinais, prodígios e maravilhas”, como em II Co 12:12). Segundo, a interpretação mais sólida dessa frase é aquela que leva em conta que as “obras” de Jesus tinham e têm por finalidade fazer a vontade do Pai e proclamar o Reino de Deus. Aí fica fácil entender: Jesus levou a mensagem do Evangelho ao povo de Israel, e a igreja já levou a mesma mensagem até os confins da terra!






João 10:10b


...eu vim para que tenham vida e a tenham em abundância.


Os teólogos da prosperidade dizem que “vida em abundância” que Jesus veio para que tenhamos é uma vida de riqueza material e saúde. Será? O que pensariam disso os mártires, que, ao contrário da riqueza, ganharam como “prêmio” pela sua fidelidade o sacrifício da própria vida pelo Evangelho? O que pensaria disso aquele missionário que abandonou tudo para viver entre uma tribo selvagem da África, pegou malária e nunca ficou rico, mas por outro lado pregou o Evangelho para aqueles que nunca tinham ouvido falar em Jesus? O que pensaria disso aquela viúva pobre que deu as duas últimas moedas e que, pelo menos pelo relato bíblico, não consta que tenha ficado rica? O que pensaria disso aquela senhora pobre da igreja que tem sempre a casa aberta para receber pessoas em necessidade e sempre tem uma palavra de consolo?


Aliás, o que pensaria Paulo, que passou por inúmeras situações desfavoráveis, até mesmo fome (Fp 4:12)? Será que essas pessoas seriam consideradas como de “vida abundante” pelos teólogos da prosperidade? Por outro lado, será que eles consideram os ricos e poderosos do nosso mundo, incluindo aí criminosos e vários políticos desonestos, como pessoas de “vida abundante”?






Marcos 10:29 (e passagens paralelas: Mateus 19:29 e Lucas 18:29,30)


Tornou Jesus: Em verdade vos digo que ninguém há que tenha deixado casa, ou irmãos, ou irmãs, ou mãe, ou pai, ou filhos, ou campos por amor de mim e por amor do evangelho, que não receba, já no presente, o cêntuplo de casas, irmãos, irmãs, mães, filhos e campos, com perseguições; e, no mundo por vir, a vida eterna.

Creio que ninguém, em sã consciência, interpreta aquilo tudo literalmente. Se alguém levar o versículo inteiro ao pé da letra, será um pervertido sexual com centenas de filhos (e de mulheres também, se seguirmos a passagem paralela de Lucas!)... Aliás, Jesus falou aquilo para os discípulos. Não consta que Pedro e os demais tenham se tornado milionários depois de abandonar tudo para seguir Jesus – pelo contrário, a maioria deles se tornou mártires. Pedro, por exemplo, continuou vivendo como pescador, e ainda ganhou a "vida abundante" morrendo numa cruz de cabeça pra baixo (se é que é verdade essa história sobre a forma como o apóstolo morreu).


O que Jesus disse é que, se você abrir mão do que tem, vai ganhar uma nova família, vai pertencer à Igreja, ao corpo de Cristo, sua nova família, que representa 100 vezes mais mães, pais, filhos e casas. E, de brinde, ainda vai ganhar perseguições. Aliás, eu me pergunto, por que nenhum desses pregadores da prosperidade cumprem a primeira parte do versículo, que fala sobre abandonar tudo (isso eles só recomendam para as suas ovelhas, que abandonem tudo nas contas bancárias deles), ou ainda o que está um pouco antes, no verso 21, quando Jesus diz ao jovem rico que este deveria vender todos os seus bens e dar o dinheiro aos pobres?






II Coríntios 8:9


... pois conheceis a graça de nosso Senhor Jesus Cristo, que, sendo rico, se fez pobre por amor de vós, para que, pela sua pobreza, vos tornásseis ricos.


Citado fora do contexto, esse versículo parece indicar que Jesus se tornou pobre para que todos os cristãos se tornassem ricos. Comecemos a ler o capítulo 8, no entanto, e veremos que Paulo elogia a igreja dos macedônios, que era pobre, e dá um “sabão” na igreja dos coríntios, que era rica. A igreja que era pobre era a mais generosa (o que já contraria a teologia de que ofertar é "semear bens materiais", uma vez que eles eram liberais e continuavam pobres), enquanto que a igreja rica era a mais avarenta.


Paulo então repreende os coríntios, e os exorta a serem como Jesus, que era rico e se fez pobre. Se eles eram ricos, é porque um dia Cristo se fez pobre, e eles deveriam fazer o mesmo em prol do sustento de Paulo e outros apóstolos/missionários, abrindo mão de sua riqueza. Não está escrito ali que Cristo se fez pobre para todos os cristãos fossem ricos (tanto é assim que os macedônios ainda eram pobres, e não era por causa de falta de generosidade).


O que está escrito é que, se os coríntios eram ricos, era por causa da misericórdia de Cristo, que abriu mão da Sua própria riqueza em prol deles.












III João 2


Amado, acima de tudo, faço votos por tua prosperidade e saúde, assim como é próspera a tua alma.


Sabemos que Jesus prometeu perseguições (citando, de novo, Mc 10:29). No entanto, quem tem o costume de escrever "desejo que você seja perseguido”?


Mesmo que seja uma certeza da Palavra de Deus as perseguições por causa do Reino, ninguém as deseja, e isso é perfeitamente natural. Nosso desejo é saúde e prosperidade – agora, se Deus deseja dar isso para nós ou não, cada caso é um caso, e vai depender da soberania divina. Eu desejo saúde para todos os que amo (assim como o apóstolo João desejava a prosperidade do destinatário daquela carta), mas não tenho certeza se essa é a vontade de Deus. Se Ele quiser, na Sua vontade soberana, que alguém morra como mártir ou morra de câncer, essa pessoa tem que dizer como Jó, "o Senhor deu, o Senhor tirou, bendito seja o nome do Senhor". Mas eu posso perfeitamente escrever que o que eu desejo é saúde para quem quer que seja. Foi isso que João escreveu para seu destinatário, mas não necessariamente aquilo era a vontade de Deus. Não faria sentido João ter escrito "desejo perseguições pra você"...






Marcos 11:22,23


Ao que Jesus lhes disse: Tende fé em Deus; porque em verdade vos afirmo que, se alguém disser a este monte: Ergue-te e lança-te no mar, e não duvidar no seu coração, mas crer que se fará o que diz, assim será com ele.


Esse ensinamento de Jesus é usado para justificar o ato de falar com as enfermidades, e ainda o uso de verbos como “decretar” ou “determinar”, que são verbos perfeitamente adequados para estarem na boca do Deus Todo-Poderoso, mas nunca de criaturas finitas e falíveis como nós.


Temos, de fato, alguns exemplos bíblicos de pessoas falando para as coisas ou executando algum ato e algo acontecendo por causa disso. Temos o caso de Jesus, que repreendeu a tempestade e o mar se acalmou, e ainda repreendeu a febre da sogra de Pedro (Lc 4:39). Acontece que Jesus, mesmo assumindo forma humana, nunca deixou de ser Deus. Mesmo assim, temos casos de pessoas comuns fazendo algo semelhante: Moisés colocou o cajado no mar e este se abriu (Nm 14:16,21); recebeu ordem de Deus para apenas falar com a rocha e esta soltaria água (Nm 20:8); Pedro mandou o coxo se levantar e este foi curado (At 3:6), entre outras coisas. Será, então, que isso significa que podemos fazer o mesmo apenas tendo fé? Depende: fé em quê?


O verso 22 diz “tende fé em Deus”. Ter fé em Deus significa acreditar no que Deus falou. Foi Deus que falou com Moisés para falar com a rocha, que colocou no coração de Pedro a certeza de que o coxo seria curado, que falou que abriria o mar... Se Deus falar com certeza que uma montanha sairá do lugar, pode falar com ela que ela sai. Caso contrário, vai tudo continuar como está!


Essa passagem não é, portanto, uma carta branca para sair por aí “decretando” e “determinando” as coisas, mas, antes, é um convite a acreditar em tudo que Deus falar – se Ele falar, vai acontecer. Quem decreta e determina é Deus, nós só podemos proclamar o que Ele já decretou e determinou.





Lucas 6:38ª


... dai, e dar-se-vos-á; boa medida, recalcada, sacudida, transbordante, generosamente vos darão.


Trata-se de mais um texto usado fora do seu contexto, principalmente pelos que gostam de dizer que as contribuições financeiras para a obra de Deus são uma espécie de barganha, que rende bens materiais para quem as dá. O argumento de Jesus começa no verso 27. “Amem os inimigos, ofereçam a outra face, bendigam (mesmo aqueles que os maldizem), dêem a quem pede etc.” No verso 31, Jesus arremata: “façam com os outros o que gostariam que os outros façam com vocês”. Se assim fizermos, se tratarmos bem as pessoas, se dermos nossas coisas para aliviá-las quando tiverem necessidade, a conseqüência lógica é que também elas nos socorrerão quando precisarmos – e nos darão medida plena, recalcada, transbordante... Se, por outro lado, as julgarmos com severidade (verso 37), seremos julgados assim também. É a lei da semeadura e da colheita. Tratem os outros bem e vocês receberão o mesmo em troca – e isso não tem nada a ver com dar ofertas à igreja em troca de bênçãos materiais.






Mateus 16:19, Mateus 12:29 e Marcos 3:27


Dar-te-ei as chaves do reino dos céus; o que ligares na terra terá sido ligado nos céus; e o que desligares na terra terá sido desligado nos céus. Ou como pode alguém entrar na casa do valente e roubar-lhe os bens sem primeiro amarrá-lo? E, então, lhe saqueará a casa. Ninguém pode entrar na casa do valente para roubar-lhe os bens, sem primeiro amarrá-lo; e só então lhe saqueará a casa.


Essas passagens são usadas para justificar a expressão “tá amarrado em nome de Jesus”, ou qualquer outro ritual para “amarrar” os demônios (em algumas versões em inglês “ligar”, em Mateus 16, é “bind”, ou seja, “amarrar”).


Também são usadas para justificar doutrinariamente uma suposta “legalidade” que o diabo e os demônios teriam para agir. Em outras palavras, na teologia da prosperidade e da confissão positiva, quem dá poder para os demônios agirem (ou tira esse poder) são as pessoas e não Deus. Deus só observaria, passivo, as atitudes das pessoas, que neste caso dão ou tiram o poder para que os seres espirituais ajam. A soberania de Deus, assim, se torna um mero detalhe, e Deus, de supremo controlador e sustentador de todas as coisas, passa para o posto de mero expectador, sendo constantemente ameaçado pelas forças do mal e precisando constantemente ser defendido por ninguém menos que nós, criaturas com o poder de “amarrar” os demônios...


Primeiramente, é preciso mencionar que a gramática de Mt 16:19 não diz que nós “amarramos” ou “ligamos” na terra e só então se “amarra” ou “liga” algo nos céus, mas exatamente o contrário. O tempo verbal grego, literalmente traduzido, é: “tudo que ligardes na terra terá sido ligado no céu”. “Terá sido” implica que primeiro foi ligado no céu, para só então nós ligarmos na terra. Em outras palavras, primeiro no céu, depois na terra, essa é a ordem – como, aliás, qualquer outra coisa que Deus faz: primeiro Deus toma a iniciativa, depois o homem segue o que Ele decretou. Esse entendimento acaba com o orgulho humano, uma vez que tira do homem qualquer possibilidade de mudar a Deus, que por falar nisso é imutável e sem qualquer sombra de variação (Tg 1:17). É verdade que Tiago diz que a oração do justo é eficaz, mas curiosamente o exemplo dado por ele foi o de Elias orando para não chover (Tg 5:17,18).


Quem, afinal, colocou no coração de Elias o desejo de orar para que não chovesse, foi o próprio Elias que convenceu a Deus ou foi Deus que moveu o profeta? Em segundo lugar, vale lembrar que o texto de Mateus não tem absolutamente nada a ver com “amarrar demônios”.


Quanto aos textos sobre “amarrar o valente”, é importante entender que Jesus não estava ensinando táticas para derrotar demônios, mas fazia apenas uma analogia entre um ladrão que invade uma casa e amarra o dono para poder roubar e aquele que expulsava os demônios (no caso, Ele próprio). Jesus havia sido acusado de expulsar demônios por ser o maioral deles, e usou dessa analogia para explicar que não fazia sentido expulsá-los sendo um deles, assim como não fazia sentido invadir uma casa sem amordaçar (ou amarrar) o dono desta. Além do mais, ainda que Jesus estivesse ensinando a amarrar demônios, quem disse que isso se faz gritando uma frase mágica?


Nunca é demais lembrar, também, que Jesus e os apóstolos só expulsaram demônios quando estes se apossavam das pessoas, eles nunca os expulsaram de um determinado lugar, como fazem alguns hoje.






Mateus 13:58 e Marcos 6:5,6


E não fez ali muitos milagres, por causa da incredulidade deles. Não pôde fazer ali nenhum milagre, senão curar uns poucos enfermos, impondo-lhes as mãos. Admirou-se da incredulidade deles.


Segundo os proponentes da teologia da prosperidade e da confissão positiva, o poder de Jesus está limitado pela nossa fé. Quanto mais fé tivermos, dizem eles, mais poder Jesus terá, e a prova seria essas passagens, que dizem que Jesus “não pôde fazer muitos milagres em Nazaré por causa da incredulidade das pessoas”. Mais uma vez, Deus é privado da Sua soberania, já que só pode agir se os seres humanos permitirem.


O sentido dessas passagens, no entanto, fica claro quando entendemos para que serviam os milagres de Jesus. Um dos termos gregos usados para “milagre”, embora não seja o que foi usado nessas passagens, mas é muitas vezes usado indistintamente em outras, significa “sinal”. Um sinal é algo que se faz para que alguém veja e creia, ou seja, é como se fosse uma prova jurídica.


Aliás, esse é o termo preferido pelo evangelista João para se referir aos milagres de Jesus. Em Jo 20:30,31, está escrito: “Na verdade, fez Jesus diante dos discípulos muitos outros sinais que não estão escritos neste livro. Estes, porém, foram registrados para que creiais que Jesus é o Cristo, o Filho de Deus, e para que, crendo, tenhais vida em seu nome.”


Em Lucas 4, temos um relato mais detalhado da ida de Jesus a Nazaré e da incredulidade das pessoas de lá, que chegaram ao ponto de tentar matá-lo. A pergunta óbvia que se faz é, por que Jesus iria desperdiçar sinais com pessoas que não estavam dispostas a crer? Não, Jesus não teve seus poderes limitados pela incredulidade do povo, simplesmente não quis fazer sinais se estes não serviriam para nada.






Deuteronômio 28:1-14, Gênesis 39:3, Êxodo 15:26, Josué 1:8, I Crônicas 22:13, II Crônicas 26:5, Salmo 1:3, Salmo 25:13, Salmo 112:1-3 etc.


São as únicas passagens bíblicas ou que prometem prosperidade para quem obedecer ao Senhor ou que relatam que alguém prosperou por causa disso. Não é por acaso que todas elas estão no Antigo Testamento. Na Nova Aliança, não há qualquer promessa de que quem for fiel aos mandamentos de Deus prosperará materialmente ou não estará sujeito às doenças que atingem os demais seres humanos. Assim como, na Velha Aliança, não havia qualquer “promessa”, como há no caso da Nova, de que quem servisse ao Senhor seria perseguido por causa da justiça – mesmo assim, vale lembrar que vários personagens do Antigo Testamento foram perseguidos, como Elias, Daniel e Jeremias.


O fato é que Deus se relaciona com as pessoas por meio de alianças. Estas alianças são feitas conforme o nível de maturidade espiritual na qual a humanidade se encontra. Exemplificando, ninguém trata o filho de 5 anos da mesma forma que trata o que tem 25. Quando o filho pequeno pede uma bala, o pai dá. Quando o filho adulto pede a mesma coisa, geralmente a resposta é “vá trabalhar!”... No Antigo Testamento, Deus tratava as pessoas como um pai trata um filho pequeno: obedeça, seja fiel, que você ganhará muitas recompensas, será feliz, suas colheitas nunca falharão, você será rico, sua mulher nunca será estéril (nem suas vacas), sua saúde será perfeita.


Desobedeça, e os céus não enviarão a chuva, as crias das suas vacas abortarão, seus inimigos o perseguirão... No Novo Testamento, por outro lado, depois que Jesus se humilhou e se esvaziou, tendo se tornado pobre mesmo sendo o criador de tudo e o dono de todo o ouro, Deus passou a tratar a humanidade como um pai que se relaciona com um filho maduro, ou seja, na base do amor e não mais das recompensas. A humanidade já estava madura para entender que deve se relacionar com Deus apenas pelo que Ele é, sem buscar bênçãos materiais e saúde em troca e sem obedecer só pelo medo da punição. Na Nova Aliança, as doenças já não são necessariamente punição pela desobediência, mas muitas vezes podem até ser bênção, já que é em meio à nossa fraqueza que o poder de Deus se aperfeiçoa.


O mais interessante é ver que, ainda na Antiga Aliança, muitos já tinham entendido essa verdade, principalmente no caso dos profetas que foram perseguidos. Notem como é tocante a oração de Habacuque: “ainda que a figueira não floresça, que falte tudo, que todas as colheitas falhem, eu contudo me alegrarei no Senhor” (Hc 3:17,18), ou ainda a forma como Jó, pelo menos no início, reage à perda de tudo: “o Senhor deu, o Senhor tirou, bendito seja o nome do Senhor” (Jó 1:21). Por mais absurdo que possa parecer, um defensor da teologia da prosperidade uma vez me disse que Jó errou por não buscar a cura...






Salmo 103:3


Ele é quem perdoa as tuas iniqüidades; quem sara as tuas enfermidades.


Davi estava num momento de alegria em que, provavelmente, tinha acabado de ver curado de uma doença, possivelmente a mesma referida nos salmos 51, 32 e 38, por causa do seu pecado. Ele diz à sua própria alma que seja grata ao Senhor, que é quem cura de todas as enfermidades. Só que Ele cura quando e como quer, e ainda assim se quiser. Eu concordo com Davi, Deus cura tudo (inclusive amputações!), mas só quando quer. Quando Ele diz não, eu me contento com o fato de que o poder dEle se aperfeiçoa na minha fraqueza, na minha enfermidade, na minha tristeza. Aliás, quando Paulo diz em II Co 12:10 que “sente prazer nas fraquezas”, a palavra grega usada para “fraquezas” é exatamente a mesma usada em Mt 8:17 – ou seja, as fraquezas nas quais Paulo sentia prazer eram as mesmas que Jesus levou sobre Si! Por que os teólogos da prosperidade nunca mencionam isso? Será que eles não sabem, ou escondem deliberadamente?






Provérbios 18:21


A morte e a vida estão no poder da língua; o que bem a utiliza come do seu fruto.


Esse texto é usado para justificar muitas coisas, dentre as quais a doutrina das “maldições” e a própria confissão positiva, segundo a qual suas palavras (confissão, no caso) têm algum poder mágico no mundo espiritual.


O livro de Provérbios é um pouco mais complicado quando se trata de colocar passagens no contexto, já que cada provérbio é um dito isolado e não faz parte de uma unidade textual. Por outro lado, existe algo chamado “contexto amplo”, que é a idéia geral do autor ao escrever uma obra, e ainda o estilo literário.


Neste caso, vemos que o livro em questão contém conselhos para a vida prática, discorrendo sobre criação dos filhos, conduta ética, temor de Deus, sabedoria, obediência às autoridades e outras recomendações que, seguidas na nossa vida prática, produzem uma vida coerente e centrada na vontade de Deus. Desta forma, não se trata de um manual de batalha espiritual nem muito menos de um tratado teológico sobre a ação de anjos e demônios, mas é um livro bem “pé no chão”.


Dito isso, podemos entender que o verso em questão trata do uso da língua no nosso quotidiano, e do grande poder que ela tem: com a língua você pode magoar alguém, desfazer uma longa amizade, pode se meter em apuros, principalmente se ofender alguém com mais poder que você, mas também pode manifestar amor, produzir reconciliação, pode evitar até uma guerra.


Quem usa a língua com sabedoria comerá do fruto que essa mesma sabedoria produz, e é isso e nada mais que o verso em questão está dizendo. Em Tiago 3:1-12 temos o mesmo tema novamente, de forma mais elaborada.






I Samuel 24:6 e Salmo 105:15


E disse [Davi] aos seus homens: O SENHOR me guarde de que eu faça tal coisa ao meu senhor, isto é, que eu estenda a mão contra ele, pois é o ungido do SENHOR.


Dizendo: Não toqueis nos meus ungidos, nem maltrateis os meus profetas.


Com base nesses dois versículos, criou-se dentro do protestantismo o mesmo sistema sacerdotal católico, no qual há uma classe especial de “ungidos” que estão acima dos demais crentes e, além disso, não podem ser criticados ou questionados, pois afinal não se pode “tocar nos ungidos”. Esses tais se dizem procuradores de Deus, verdadeiros mediadores, como era, por exemplo, Moisés em relação ao resto do povo de Israel. Cito essas passagens aqui, portanto, por serem usadas com freqüência pelos líderes que ensinam a teologia da prosperidade.


Mas, afinal, o que significa “ungidos”? “Ungir” significa “derramar óleo sobre”, e era, na cultura judaica antiga, a forma como os sacerdotes e reis eram iniciados no seu ofício. Em outras palavras, a unção credenciava o indivíduo para ser mediador entre Deus e as outras pessoas. Por esta razão Jesus é chamado de Cristo ou Messias, que são palavras que significam “ungido”. No Novo Testamento, contudo, o termo “unção” só aparece duas vezes, dentro da mesma passagem, em I Jo 2:20 e 27, que é um texto que diz que todos nós recebemos a unção do alto – em outras palavras, bem de conformidade com a doutrina protestante, todos nós somos sacerdotes. A palavra “ungido”, por outro lado, só aparece na sua forma transliterada do grego, ou seja, Cristo, se referindo a Jesus e nunca aos líderes da igreja, nem mesmo aos apóstolos.


E quanto aos versículos de I Sm 24:6 e Sl 105:15? A primeira passagem fala de Saul, ungido como rei, e a segunda fala dos patriarcas Abraão, Isaque e Jacó, que Deus aqui chama também de ungidos. “Tocar”, “estender a mão contra” e “maltratar”, em ambos os contextos, significa utilizar de violência física e não a crítica ou o questionamento. Não há qualquer legitimidade exegética para transpor essas passagens do seu contexto original e aplicá-las aos líderes da igreja, por mais abençoados que estes supostamente sejam. O leitor pode ficar tranqüilo, o seu líder não é infalível nem intocável, quem crê dessa forma é o catolicismo em relação ao papa. Se o seu líder falar ou ensinar algo que não se harmoniza com as Escrituras, ele deve sim ser confrontado (com respeito e submissão, obviamente, afinal, a não ser que ele seja um usurpador, Deus o colocou como líder) e, se ele tentar usar de intimidação citando as passagens já citadas, desconfie das intenções dele.






Caro leitor, se você gostou (também se não gostou) deste artigo e quiser fazer alguma observação, crítica, correção ou agradecimento, sinta-se encorajado a me escrever. Gostaria muito de saber sua opinião!


Renato (renfontes@gmail.com)





Referências bibliográficas auxiliares



Sobre a teologia da prosperidade:
HANEGRAAFF, Hank. Cristianismo em crise. Rio de Janeiro: CPAD, 1996.
ROMEIRO, Paulo. Evangélicos em crise: decadência doutrinária na igreja brasileira. São Paulo: Mundo Cristão, 1996.
YANCEY, Philip. Decepcionados com Deus. São Paulo: Mundo Cristão.


Sobre a interpretação bíblica:
FEE, Gordon D; STUART, Douglas. Entendes o que lês? São Paulo: Vida Nova, 1997.
ZUCK, Roy B. A interpretação bíblica. São Paulo: Vida Nova, 1994.

Agradeço ao irmão Renato N. Fontes por autorizar a publicação deste artigo neste blog.