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domingo, 19 de novembro de 2017

Nós somos uma alma ou possuímos uma?



Lucas Banzoli

I–Conceitos com relação à alma

Dualismo – A visão do ser humano no contexto imortalista é que este possui uma natureza dualista, isto é, tem um corpo e possui uma alma [nephesh, no hebraico, psiquê, no grego], que seria imortal e estaria presa dentro do corpo e que é liberta por ocasião da morte deste, indo imediatamente para o Céu ou para o inferno, durante toda a eternidade. Na ressurreição, apenas o corpo morto ressuscita, pois a alma imortal já está lá, liberta do corpo, há muito tempo, religando-se a este por ocasião da ressurreição dos mortos que se dá no momento da segunda vinda de Cristo (cf. 1Co.15:22,23).

Essa é a visão dualista da natureza humana, de imortalidade da alma. Noutras palavras, você é uma pessoa que tem outra “pessoa” dentro de você. A visão tricotomista do ser humano ensina o mesmo contraste dualista de corpo e alma e prega que nós somos um espírito, possuímos uma alma e moramos em um corpo. Portanto, ambas as visões – dualista e tricotomista – serão refutadas da mesma forma, visto que possuem os mesmos conceitos básicos sobre a constituição da natureza humana.

Holismo – O conceito holista da natureza humana prega, ao contrário da imortalidade, que o ser humano não tem uma alma: ele é uma alma. Ele vive como uma alma, ele morre como uma alma. Uma alma vivente significa apenas um “ser vivo”. Nós não temos uma alma imortal presa dentro do nosso corpo que é liberta por ocasião da morte. A morte é o último inimigo a ser vencido (pelo fator “ressurreição”), e não o libertador da “alma imortal” (cf. 1Co.15:26). Pessoas morrem, pessoas ressuscitam.

Corpo, alma e espírito são características da mesma pessoa e não pessoas separadas. O espírito é o princípio ativador da vida, é aquilo que dá animação ao corpo, é o sopro de Deus por meio do qual respiramos e somos seres (almas) viventes. É esse o simplismo bíblico sobre a criação da natureza humana, que elimina os complexos malabarismos propostos por Platão em sua tese sobre a natureza dualista e a sobrevivência da alma após a morte em um estado consciente.


II–Qual é o conceito correto?

“E formou o Senhor Deus o homem do pó da terra, e soprou em suas narinas o fôlego de vida, e o homem tornou-se uma alma vivente” (cf. Gênesis 2:7)

Eis aí a passagem bíblica acerca da criação do ser humano, que nos dá um perfeito entendimento dos conceitos bíblicos de corpo, alma e espírito. É aqui que entra em cena algo muito desconhecido pela maioria das pessoas: biblicamente, o homem não tem uma alma, ele é uma alma. Ele “TORNOU-SE” uma alma e não “obteve” uma!  A alma é o que o homem passou a ser, e não o que ele obteve de Deus. O corpo é a alma em sua forma exterior. A ideia hebraica de personalidade é a de um corpo animado pelo fôlego de vida (espírito) que alimenta o corpo, e não de uma alma presa dentro deste corpo. Assim, podemos entender que:

“E formou o Senhor Deus o homem do pó da terra [corpo], e soprou em suas narinas o fôlego de vida [espírito], e o homem tornou-se uma alma vivente [alma]” (cf. Gênesis 2:7 – grifo meu)

A passagem bíblica que relata a criação do ser humano também nos deixa um sentido claro de corpo, alma e espírito. Nenhum é um elemento que Deus implantou no homem, imaterial e imortal, que saia dele após a morte, com consciência e personalidade. O espírito é tão somente o fôlego de vida que Deus soprou em nós e que o possuímos pela duração de nossas vidas terrenas. Nós permanecemos com este fôlego que nos concede respiração para continuarmos vivos durante a nossa existência terrestre, mas, quando este sopro se vai, as “almas viventes” tornam-se “almas mortas”.

O que retorna a Deus é o princípio de vida que ele soprou em nós a fim de conceder animação ao corpo formado do pó, e não uma alma imortal. Este princípio animador da vida é possuído tanto por homens como por animais (cf. Gn.6:17; Gn.7:21,22; Ec.3:19,20; Gn.7:15; Sl.104:29). Este princípio é garantido tanto aos seres humanos quanto aos animais pela duração de sua existência terrena. A alma, no conceito bíblico, é que o ser humano “tornou-se” e não “obteve”. Deus não colocou uma alma no homem. Por isso mesmo, morrendo o homem, morre a alma (cf. Nm.31:19; 35:15,30; Js.20:3, 9; Gn.37:21; Dt.19:6, 11; Jr.40:14, 15; Jz.16:30; Nm.23:10; Ez.18:4; Ez.18:21).

Já a visão dualista em sua totalidade defende que o sopro de vida que Deus soprou em nossas narinas é a própria alma imortal implantada no ser humano. Sendo assim, o sopro de Deus em nossas narinas é o espírito (alma) imortal implantado nele, totalmente independente do corpo, preso dentro dele e liberto após a morte, com consciência e personalidade. Sendo assim, a narrativa de Gênesis 2:7 deveria ser entendida da seguinte maneira:

“E formou o Senhor Deus o homem do pó da terra [corpo], e soprou em suas narinas o fôlego de vida [espírito/alma imortal], e o homem tornou-se uma alma vivente” (cf. Gênesis 2:7 – grifo meu)

Essa é, contudo, uma interpretação tendenciosa que deturpa completamente a clareza do texto bíblico. Não é necessário ser nenhum grande teólogo para perceber que tal interpretação é inválida pelo fato que adultera os sentidos primários de corpo, alma e espírito, que são deixados de maneira bem clara na narrativa da criação da natureza humana em Gênesis 2:7. Além de ignorar o fato de que a primeira vez que alma [nephesh] é mencionada na Bíblia é relacionado ao próprio ser humano como um todo, tornando-se uma alma e não obtendo uma, também altera nephesh para o meio do versículo quando na realidade ela é claramente relacionada ao final deste. Tudo não passa de uma completa manipulação bíblica textual.

A passagem da criação do homem coloca nephesh no fim do verso, e não no meio como querem os imortalistas. A alma é o que o homem “tornou-se”; o “espírito” é o que foi soprado nele para dar animação ao corpo formado do pó. Pelo fato de Deus não ter revelado a Moisés uma realidade dualista do ser humano, este narra simplesmente o princípio animador da vida dando animação a uma “alma vivente”. Esse total simplismo bíblico nega inteiramente que a natureza humana seja dualista, composta por uma alma imortal e por um corpo mortal. A revelação de Deus a Moisés incluiu apenas um corpo proveniente do pó tornando-se animado, sem qualquer tipo de alma sendo ingerida dentro da substância corporal para lhe conceder imortalidade.

Com a implantação do sopro de Deus em nossas narinas, o homem tornou-se uma “alma vivente”, e não uma “alma imortal”! Ora, se a interpretação correta fosse a dualista, então a sequência imediata de tal passagem seria que o homem tornou-se (ou melhor, “obteve”) uma “alma imortal”, “imaterial”, pois o termo “alma vivente” após a implantação do espírito-ruach implica que pode se tornar “alma morta” após a retirada do espírito-ruach. Isso é somente lógica.

Quando a Bíblia diz que em resultado do sopro divino “o homem tornou-se uma alma vivente”, ela está dizendo apenas que o corpo formado literalmente do pó da terra ganhou animação e se fez um ser vivo, que respira – nada além disso. O sangue (vitalidade da alma – cf. Lv.17:11; Gn.9:4,5) começou a circular, o cérebro começou a raciocinar e o coração a bater, com todos os sinais ativados. O homem tornou-se uma “alma vivente”, ou seja, ou ser vivo, que deixa de existir na morte e volta à existência na ressurreição gloriosa.

Não houve um componente imaterial e imortal colocado no ser humano. Declarado em termos simples, “uma alma vivente” significa “um ser vivo”, e não “uma alma imortal”! Evidentemente a alma é considerada “vivente” enquanto vive, passando a ser “alma morta” por ocasião da retirada do fôlego de vida [espírito] no falecimento. Uma alma vivente significa simplesmente um ser vivo, que morre. Alma é vista como a natureza humana como um todo, e não como uma parte do ser humano separada do corpo e presa dentro deste.

A forte tentativa de ignorar o simplismo bíblico no relato da criação humana não provém de alguma razão teológica (de fato, os imortalistas fazem de tudo para colocar uma “alma imortal” no relato da criação onde não aparece nada disso), mas sim porque negam em aceitar o fato óbvio de que a narração da criação traz uma natureza holista e não dualista do ser humano. Isso, evidentemente, os faria negar a sua crença de que Deus tenha implantado no homem um elemento eterno lhe concedendo imortalidade, o que daria um fim na doutrina do “estado intermediário” e do tormento eterno.

Que nephesh não é o próprio espírito [ruach, no hebraico] implantado no ser humano com imortalidade e personalidade, isso fica muito bem claro na Bíblia Sagrada, embora sejam coerentes em alguns de seus sentidos secundários. A ignorância em aceitar o sentido claro de corpo, alma e espírito de acordo com a Bíblia segundo Gênesis 2:7 causa, além de adulterações no sentido do texto, uma confusão ainda maior para solucionar os problemas depois, por causa da interpretação tendenciosa e errônea por parte dos dualistas.

Paz a todos vocês que estão em Cristo.

Por Cristo e por Seu Reino,
Lucas Banzoli (apologiacrista.com)

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